21/05/2021 - Schayla Jurk
A
evolução da sociedade ao longo das décadas é a expressão de mudanças culturais,
sociais e, recentemente, tecnológicas. Um espaço que conecta a ciência, a sociedade
e a evolução da arte oportuniza também reflexões e conhecimento sobre a história
da humanidade por diferentes ângulos. Pinturas, esculturas, gravuras,
fotografias criam a linha cronológica do museu e são os principais elementos
para compreender o diálogo que traduz a formas de viver, habitar e relacionar
com o ambiente. A coleção deve ser preservada porque retrata em forma as
transformações através do tempo. Neste sentido o museu assume o protagonismo na
criação de uma estrutura que também é símbolo do design e da arquitetura numa
combinação de recursos visuais e técnicos que evidenciam a complexidade do
espaço.
Anualmente,
18 de maio, é celebrado o Dia Internacional dos Museus, criado em 1977, através
da iniciativa do ICOM - Conselho Internacional de Museus, órgão que integra a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura (UNESCO). Um momento para refletir sobre a rica herança patrimonial, que é preservada e divulgada pelos museus e as principais ações que despertam a vitalidade dos museus nas últimas décadas. Afinal, os museus constróem narrativas, trazendo sentido para os objetos expostos
e criando uma linha do tempo de conexões entre passado, presente e futuro.
Inspirados com o Dia Internacional dos Museus, nós do
NCD, convidamos Márcia Regina Escorteganha Laner, que é conservadora e
restauradora da Fundação Cultural Catarinense e também especialista em
Arquitetura: Conservação e reabilitação de conjuntos urbanos (C/R);
Edificações(C/R) para compartilhar os aprendizados, os desafios que despertam a
inquietude e curiosidade que motivam a atuação profissional em museus.
O que significa reimaginar o futuro dos museus?
Acho que estes tempos desafiadores e difíceis da pandemia são
uma divisão de águas para muitos sistemas pré-estabelecidos. Fizeram com que os
museus parassem, respirarem e repensem seu papel de Instituição. Museu como
repositório de memória e história, muitas vezes estático e enraizado em suas
próprias crença está passando por uma mudança significativa da virtualidade dos
acervos e uma ampliação, além das fronteiras físicas, com uma visibilidade e expansão sem precedentes dos acervos
museais e suas informações via Internet. Mas atenção! Um sentido de apropriação
não é excludente do outro. Vejo isso como parceria, pois ao mesmo tempo que
acontece a divulgação dos museus e seus acervos na onda virtual não se iguala
ou é a mesma coisa que a apropriação do objeto-acervo ao vivo onde a percepção
de apropriação é única. Essa percepção registra no nosso inconsciente e na memória
as características dos objetos-acervo que se transformam em apropriação de
sentimento e emoção peculiar de cada indivíduo. E reimaginar o futuro dos
museus é conciliar estes dois mundos, o
físico e o virtual , cada um com suas características e peculiaridades de forma
conjugada e cúmplice. O objetivo é alcançar a divulgação da memória e da
história dos acervos musicais como benefício e apropriação social marcando as
gerações que se sucedem de forma que percebam e se identifiquem com o
significado e a significância desta memória e da história de que fazem parte e
está guardado nos museus.
Os museus são importantes instrumentos de preservação da
memória cultural de um povo, e responsáveis por seu patrimônio material ou
imaterial. Por que preservar a história e a memória do ser humano sempre foi e
ainda é um grande desafio?
É um desafio diário e complexo, tanto para a preservação
física porque os materiais também tem tempo de vida (envelhecem e morrem), quanto
na preservação da memória (imaterial) que necessita de muita pesquisa
interdisciplinar e transdisciplinar. Os acervos sofrem muito com a dissociação
de registros e informações. Este desafio
de preservação dos acervos museais é e será eterno e contínuo porque envolve
vários campos de conhecimento científico, técnico e social. Além disso, o
patrimônio museal é dinâmico, apesar de termos um preconceito que é estático
porque está guardado numa instituição ou na reserva técnica. O museu está em
constante acréscimo de peças,
movimentação com suas exposições e
intercâmbio de acervos que dão vida e cumpre seu papel social de
comunicação e visibilidade, além de proporcionar a apropriação pelo indivíduo fazendo
sua própria leitura da obra para agregar significado e valorização deste
patrimônio museal.
Por muito tempo, os museus eram locais restritos e
elitizados, mantidos por pessoas com algum poder aquisitivo. Essa é uma
característica importante que ainda determina uma pré-conceito?
A pandemia provocou o fechamento dos museus do mundo inteiro
e fez com que este preconceito elitista caísse por terra, pois se abriram os
museus numa nova versão-" a visão
virtual de seus acervos" que podem
ser acessado pela geração Internet de qualquer lugar do planeta. Exemplo: posso
estar em Tókio e ver o acervo da Pinacoteca de São Paulo ou mesmo de pequenos
museus do interior como da WEG de Jaraguá do Sul ou do Museu Histórico de Santa
Catarina. O espaço físico não limita ver o objeto-acervo como também sua
arquitetura edificada com seus elementos decorativos ecléticos e você só
precisa de um celular, comum a qualquer classe social hoje dia. Acho sim que
este PRÉ-CONCEITO elitista realmente ficou nos velhos tempos. HOJE o museu e seus acervos são de TODOS. Na
minha opinião acho que não se deve cobrar para entrar em museu que deve ser
público e gratuito, com acessibilidade social plena.
Qual a importância dos museus nos processos arquitetônicos?
Importantíssimos. Sempre digo que a estrutura arquitetônica
que abriga um museu se torna parte dele. O espaço adquire identidade se
integrando ao acervo como peça imóvel museal. É uma transformação fantástica
quando uma edificação recebe um museu, principalmente se for histórica. Essa
junção se transforma em um ponto nodal e de referência do tecido urbano se
integrando à paisagem urbana e cultural da cidade. Especial é a cidade que
valoriza seu patrimônio arquitetônico e urbanístico ao implantar cada vez mais
museus nas suas edificações, mostrando e chamando a atenção da população para estas
joias raras que muitas vezes estão abandonadas no esquecimento e na falta de
manutenção. Os museus contribuem nos processos arquitetônicos com as exposições
sobre elementos arquitetônicos e o "saber fazer" nos ensinamentos,
além das técnicas construtivas utilizadas por nossos antepassados como também a
própria edificação que abriga o museu. Este aspecto tem o fator temporal em que
podemos ver nas estruturas e as soluções que deram certo e passar por todos os fatores de
deterioração e riscos. É um laboratório que influência na construção das
arquiteturas atuais. As arquiteturas são um grande livro ao céu aberto para
todos (estudantes, pesquisadores e população em geral) poderem observar,
perceber e interagir com os estilos arquitetônicos e suas soluções
construtivas.
Os museus catarinenses têm representatividade no cenário
nacional pela importância e peculiaridade dos acervos. Quais são os principais
elementos que determinam essas características?
Sim. Tem muita representatividade no Brasil e América
Latina, mas falta expandir para o mundo. Acho que a globalização virtual dos
museus vai ajudar, mas depende de mudança de paradigmas institucionais e
financeiros para conquistar isso. Os principais elementos característicos da
peculiaridade dos museus catarinenses são acervos artísticos, históricos e
arquitetônicos ÚNICOS. Não existe nada igual em qualquer lugar do mundo. Os
museus têm esta característica de mostrar o "valor da cultura local
genuína", portanto se tornam espaços ÚNICOS e por isso cada museu é
diferente um do outro. É isso que faz uma pessoa sair de onde mora para visitar
outro lugar. Um exemplo: vem um turista de Estocolmo para visitar um pequeno
museu em Santa Catarina porque lá é outra cultura e a pessoa vem ver e se
admirar como é nossa cultura e nossa história e vice-versa. Isso é inerente ao
ser humano: conhecer as diferenças e diversidades culturais. Os nossos museus
são realmente especiais e merecem mais atenção e políticas de valorização e
preservação, pois tem muito acervo que conta a trajetória do povo catarinense
que merece ainda ser qualificada, organizada e valorizada.
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