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Memória afetiva: as lições do 11 de setembro para arquitetura

11/09/2020 - Schayla Jurk

08h46min da manhã de 11 de setembro de 2001. O Voo 11 da American Airlines estava sob controle de cinco sequestradores membros da al-Qaeda. O avião decolou de Boston e ia para Los Angeles, mas neste exato momento mudou a rota e atingiu a Torre Norte do World Trade Center. Começava neste instante um fato que marcou o então novíssimo século XXI. Poucos minutos depois, às 09h03min, o voo 175 atingiu a Torre Sul e 34 minutos depois o voo 77 foi lançado contra o Pentágono, prédio que sediava o Departamento de Defesa dos Estados Unidos. Este é o enredo principal que mudou a história da humanidade, mas trouxe importantes lições para vida e para a arquitetura. 




Foto: Jason Szenes/EFE/EPA


 

“No dia 11 de setembro caíram duas imensas grandes árvores numa importante tribo dos homens brancos. O acidente provocou uma grande destruição. Muitas pessoas morreram e muitas ficaram feridas. Eles estavam bastante tristes.” Essa notícia veio pelo ar, atravessou cidades, rios e foi parar numa tribo indígena no coração da floresta. Quando Kaká Verá (um importante líder indígena) chegou nessa tribo, foi bombardeado por perguntas: como, onde, porque, ?! Essas perguntas em nada diferiam das que o mundo todo fazia. Porém tinham eles também uma pergunta singular, aflita e urgente: - “como podemos fazer para ajudar?  Nós enviamos uma mensagem por tambor dizendo a eles que nosso excedente de mandioca estava à disposição, pois talvez estejam com fome... mas ainda não obtivemos resposta. E não sabemos para onde mandar as mandiocas...”, retrata a psicanalista e Analista Ambiental, Mônica Martins de Godoy Fonseca, do trecho da história que ouviu de Kaká Verá.




Durante 30 anos as Torres Gêmeas reinaram como símbolo nova-iorquino. A construção na década de 1970 redefiniu o skline da cidade e trouxe um novo significado para a paisagem urbana de New York. A implantação do complexo do World Trade Center instaurou um marco arquitetônico com atributos que colocavam a edificação numa condição de obra artística. “Eu tinha estado lá um ano antes do atentado e lembro como se fosse hoje. A gente chegava de metrô pelo subsolo, praticamente num shopping. Depois subíamos por elevador para chegar na recepção com muito controle de segurança, que não estávamos habituados na época. Controle de mochila, pacote e detector de metais que passavam várias vezes a cada troca de elevador. Quando chegava no topo um mirante maravilhoso, uma vista incrível de New York”, relembra a arquiteta Ana Wolf.




A construção das Torres Gêmeas mudou o cenário no centro da cidade e trouxe um novo sentido para o concreto na ilha de Manhattan. O complexo WTC criou uma relação de hierarquia com New York e também despertou o olhar do mundo para aquele que seria o cenário de um dos maiores atentados da história da humanidade. “Eu lembro muito bem desse dia. Eu tinha saído muito cedo e na volta escutei sobre uma explosão no rádio do carro. Chegando em casa liguei a televisão e foi muito chocante. Vi ao vivo o segundo avião batendo”, recorda a decoradora Cláudia Couto. 




Nestas quase duas décadas, muitos americanos ainda continuam travando uma batalha contra os efeitos físicos, psicológicos e até mesmo arquitetônicos dos ataques e percebem que ainda não estão totalmente preparados para um 11 de setembro sinônimo de história. Enquanto isso, a vida de muita gente mudou de lá para cá, mas na memória o fato é latente e marcou um momento importante da jornada. “Eu não vou esquecer esse dia em que eu estava na faculdade fazendo o projeto 7 quando o telefone começou a tocar. Os colegas estavam ligando uns para os outros desacreditados com o que estava passando na TV e com as notícias.  Eu estava projetando, na minha casa, e foi um sentimento horrível. Totalmente incrédula com o que estava vendo. As Torres Gêmeas eram um marco na arquitetura para nós, na época estudantes, uma referência e um desejo de um dia conhecer”, descreve a arquiteta Georgia Gamborgi. 




A reconstrução do complexo é uma possibilidade de transformar o espaço urbano, projetando uma construção de uma nova identidade. “É inquestionável a necessidade de recuperação da área destruída pelo atentado em 11 de setembro. Certamente, a reconstrução do complexo promoverá a requalificação do espaço sob os aspectos funcionais da vida cotidiana dos nova-iorquinos e, também, promoverá o resgate moral da sociedade americana. Porém é um grande desafio para a própria arquitetura, pois o que foi perdido com o desaparecimento das Torres Gêmeas jamais será recuperado”, explica a mestre em arquitetura e urbanismo da Universidade de Brasília, Cláudia da Conceição Garcia que escreveu o estudo de caso o conceito de Identidade e Diferença na re-qualificação do espaço da cidade: O caso do World Trade Center.

  



Uma década depois, o lugar que traz várias lembranças é transformado por um novo símbolo. O Museu e Memorial do 11 de Setembro, em Nova York desenhado pelo arquiteto Michael Arad, da Handel Architects tem duas piscinas em mármore cinza de 4 mil metros quadrados e quedas d’água de 9 metros de altura. Arad venceu uma concorrência com 5.201 candidatos de 63 países e chamou o projeto de “Refletindo a Ausência”. Parapeitos de bronze com os nomes das 2.983 vítimas de 2011 de 372 nacionalidades diferentes são a memória viva. “Eu tive o prazer, no ano passado, de ir até o Memorial do 11 de setembro em New York. Realmente é algo que choca e ao mesmo tempo toca mais o coração da gente. Estar lá no local é perceber e sentir tudo que aconteceu e até mesmo uma oportunidade de conversar com as pessoas para saber tudo que mudou, uma história e uma vida da cidade inteira”, relembra Georgia. 





O museu, inaugurado em 15 de maio de 2014, tem 10,3 mil peças. Uma verdadeira reconstrução histórica composta por 2.380 doações particulares, 2.136 documentos e 37 grandes objetos retirados do World Trade Center como os fragmentos dos aviões, colunas de aço retorcidas e um carro de bombeiro parcialmente destruído.




Neste processo de reconstrução dos espaços, The Glade, dentro da Praça do Memorial Nacional do 11 de Setembro, é o reconhecimento dos sacrifícios dos funcionários de resgate e recuperação, a comunidade de socorro, sobreviventes e a população de Manhattan. O projeto revela um caminho que percorre a rampa principal usada pelos trabalhadores de resgate e recuperação. No trajeto, seis grandes elementos de pedra abrem caminho para cima e para fora do solo e criam uma série de passagens que terminam perto da Árvore do Sobrevivente, símbolo da resiliência de New York. É a materialização que substituiu o aço e os destroços numa perspectiva arquitetônica. 





11 de Setembro: o que mudou e que lições aprendemos após 19 anos.

 

Construir um Mundo Melhor

Por Cláudia Couto – decoradora


Avaliar o quanto a vida é cheia de surpresas e o quanto podemos construir de melhor pra esse mundo com mais segurança, conforto e fé. Não posso dizer se na forma de criar houveram mudanças, mas na forma de pensar acredito que todo mundo procurou refletir um pouco mais. Não podemos deixar que o terrorismo nos mude mas que ele nos faça refletir que é uma guerra inglória. Apenas com boas ações que reflitam e melhores comportamentos teremos um Mundo melhor.


 

Concreto indestrutível

Por Aliciana Stein- arquiteta

 

Acho que este fato nos lembrou que não existe construção indestrutível.  E o valor de um edifício, por mais alto que seja, é nada comparado a vida humana. Acreditamos que a Arquitetura existe para facilitar e valorizar as nossas vidas!

 

Os sentimentos fazem de nós humanos, fazem de nós pessoas

Por Georgia Gamborgi – arquiteta


O motivo, na minha opinião, mais banal é como o ser humano pode ser tão medíocre e deixar de valorizar sentimentos tão puros que existem e só nós podemos enaltecer e externar. Para mim mudou muito a forma de enxergar o ser humano e perceber como um sentimento tão medíocre pode destruir vida e marcar uma cidade para sempre. Além disso, destruir um marco de construções como as Torres Gêmeas que eram para o mundo tudo. Sem dúvida, o ser humano é muito mais que esse episódio por uma disputa religiosa ou falta de conhecimento entre as raças. O dia 11 de setembro é para parar e pensar nos verdadeiros valores dos seres humanos.

 

E o mundo lá fora silenciou

Por Ana Wolf- arquiteta  


A gente pode levar isso para a vida. Nos preocupamos com tanta coisa e o mal vem de fora. A gente tem que se blindar, tem que ser positiva e pensar coisas boas, procurar não ofender ninguém. Claro, eles se sentiram ofendidos e alguma coisa tocou eles a ponto de matarem tantos inocentes. Uma lição para nossa profissão é que podemos assumir uma postura mais simples diante da vida porque ali eles não derrubaram só as Torres, eles foram direto no orgulho de um povo.  As Torres sempre foram motivo de orgulho para New York, para o país e até para a gente. Nós temos que fazer coisas mais simples, mais delicadas, menos ofensivas e mais ligadas a natureza pra não despertar estes sentimentos.

 

A história na tribo dos homens brancos.

Por Mônica Martins de Godoy Fonseca- Psicanalista e Analista Ambiental.


Como me disse Kaká Verá quando me contou esse episódio: “e o mundo civilizado nem ficou sabendo da oferta das mandiocas... deve ser porque as notícias ruins voam enquanto que as boas ecoam...”. Esse foi meu maior aprendizado com o episódio 11 de setembro. Me pergunto sempre a partir dessa história como fazer para ecoar dando voz e vez para as boas notícias. Acho que seriamos uma sociedade diferente se soubéssemos fazer isso!

*O episódio está no começo deste texto. 



Fotos: Divulgação sites Globo, Gazeta do Povo e CNN

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